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O presidente da Argentina, Alberto Fernández, chega ao Aeroporto Internacional Ngurah Rai antes da Cúpula do G20 em Bali, Indonésia, 14 de novembro de 2022.

O Brasil não precisa olhar muito longe para aprender como a irresponsabilidade fiscal pode despedaçar a economia de um país. A inflação na Argentina beira os 100% e o peronismo, com seu desinteresse pela redução do déficit fiscal, é um dos principais fatores que a levaram a esse cenário caótico.

“O que realmente destruiu a Argentina foi o peronismo, um sistema organizacional político onde existe uma força muito grande de movimentos sindicais”, destacou o economista e doutor em relações internacionais Igor Lucena. “A organização política sindical do país coloca como o bem superior o corporativismo: não importam os custos fiscais”, descreveu.

Absorver gastos do governo que não conseguem ser desvinculados faz parte dessa organização político-econômica do país que, segundo o especialista, é muito difícil de ser combatida sem um plano radical econômico, tal qual foi o Plano Real no Brasil.

“O peronismo transformou a Argentina, que era um dos países mais ricos da América Latina, em um dos mais pobres”, frisou Lucena.

Dentro desse sistema, o país hoje comandado pelo peronista Alberto Fernández imprime dinheiro descontroladamente, gasta mais do que arrecada e ainda toma emprestado em dólar – precisa, portanto, devolver em dólar. Isso se torna quase um círculo vicioso, no qual as desvalorizações cambiais tornam as dívidas impagáveis.

Atravessando o Oceano, outro acontecimento recente envolveu a ex-premiê Liz Truss, a quinta no Reino Unido desde 2016. A dança das cadeiras, em que ela ficou por apenas 45 dias, também esteve relacionada às questões fiscais. 

A proposta inicial de Truss era criar um grande corte de impostos, que beneficiaria até os mais ricos, dentro de um mini-orçamento, com um Estado enxuto, muito diferente do argentino. Porém, para cobrir o buraco nas contas do governo, a ideia era pedir empréstimos bilionários. O temor de um aumento na dívida pública preocupou os investidores e fez a libra cair para o menor valor da história frente ao dólar.

Depois dos investidores demonstrarem pessimismo em relação aos planos econômicos de Truss, o governo britânico anunciou mudanças, mas não foram o suficiente para manter a primeira-ministra recém-chegada ao poder. Ela renunciou e a rápida movimentação na liderança do Reino Unido pode ter evitado maiores tragédias econômicas.

A Grécia, por exemplo, apesar de sofregamente recuperar parte da credibilidade econômica internacional, ainda vive consequências de irresponsabilidades fiscais de mais de dez anos atrás. De acordo com uma pesquisa recente do Instituto Marc, a maior preocupação da população grega é o aumento do custo de vida (para 84,5% dos gregos). Esse problema está muito à frente das tensões com a Turquia (44%), por exemplo.

Diante de uma inflação galopante, que atingiu 12,1% – uma das mais altas da União Europeia, segundo o Eurostat -, foi especialmente no campo da energia que os aumentos foram os mais espetaculares: os preços do gás quadruplicaram em um ano (+ 332%) e os da eletricidade subiram 30%. À medida que o inverno se aproxima, muitos gregos temem que não possam se aquecer adequadamente.

Quando a crise econômica eclodiu, em 2010, as taxas subiram e o país não podia mais se financiar nos mercados internacionais. Em 2015, após a chegada ao poder do governo de esquerda radical de Alexis Tsipras e o confronto com Bruxelas para reduzir as medidas de austeridade, as taxas chegaram perto de 11%.

Demorou para Atenas recuperar a confiança. A mudança política em julho de 2019 também teve um impacto positivo nos investidores, que consideraram o governo conservador de Kyriakos Mitsotakis menos imprevisível, promovendo a redução dos impostos sobre a propriedade, as empresas e as contribuições sociais. Mas ainda existe um longo caminho para dar conta dos prejuízos de tantos anos.

Diante desses exemplos, a política monetária no Brasil é eficiente e teve até mesmo três meses de deflação neste ano. Para Lucena, o maior risco do país hoje é a imaturidade fiscal. “A gente não pode gastar mais do que a gente arrecada”, alertou. O economista apontou que o que segura o Brasil é a maturidade cambial e monetária, mas existe o risco de seguir caminhos como os dos países citados na reportagem se houver total descontrole dos gastos fiscais.

“Por isso é tão importante que essa PEC de transição que está sendo anunciada tenha um limite próximo a R$ 70 ou 80 bilhões e sirva só para este ano. E que, no ano que vem, a gente tenha mudança do teto de gastos para um controle de dívidas no longo prazo”, resumiu Lucena.


Fonte: Gazeta